Luau Drey

Luau Drey
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quinta-feira, 22 de julho de 2010

POLITIZADA

Sempre achei essa palavra bonita: POLITIZADA.
Meu pai dizia: "o pior ignorante é o ignorante político. Seja POLITIZADA.” E essa foi uma lição que eu aprendi muito cedo. Aos 8 anos ele me fez beijar a mão do Jânio Quadros. Aos 16 ele foi comigo tirar meu título de eleitor, que eu carrego, orgulhosamente, na minha carteira há alguns (muitos) anos...
Nunca concordamos politicamente. Ele sempre foi de direita, meio reaça e eu sempre fui uma garota "subversiva" (não adiantou nada beijar o Jânio). Mas hoje tenho certeza que ele adorava isso. Dizia sorrindo aos meus tios : "Luciana é uma comunista vermelha, comedora de criancinhas". E se divertia ao contar meu derradeiro destino se eu tivesse nascido algumas décadas antes: perseguida política, com absoluta certeza. E morreria nos porões do DOPS, pois ele não tinha recursos para me manter em Londres (em caso de extradição).
Seu Armando sempre tinha histórias para contar do regime militar. O medo dele de ser amigo de algum comunista disfarçado e ser preso. Do foco no trabalho para nem saber o que era política. E de como era difícil viver na ditadura. Como tudo tem seu lado bom, ele me dizia que na década de 60 os jovens eram mais engajados, lutavam por uma causa. Era divertido ler jornal e perceber que uma ou outra matéria havia sido censurada e no lugar estava uma receita de bolo. E que naquele momento não tínhamos censura na imprensa, mas na verdade ela estava disfarçada em todas as redações que sucumbiam a interesses políticos e econômicos deste país. Desconfio q ele já sabia que eu prestaria vestibular para Jornalismo alguns anos depois e cursei os semestres sonhando com um jornal revolucionário, mas muito criativo, inventando formas de burlar a censura (que já não existia mais), aliado a jornalismo inovador. Ele protestou por essa escolha, queria que eu fizesse Direito... Mas sempre demonstrou um interesse peculiar na minha caminhada pela Universidade. Quanto estava mal humorado dizia: "vai ser jornalista política? Vai ficar em Brasília produzindo falsas notícias ou vai fazer o mesmo jogo que “eles”?" Eu, para provocar, respondia: "não. Vou ser colunista social!"
Ele não deixava barato: "Mas o panorama político hoje não tem graça nenhuma!!” E não tinha mesmo...
Para mim ele era um comunista disfarçado, que se dizia de direita porque era medroso demais para lutar contra o regime. Mas ele era simpatizante do extinto PRONA (Partido da Reedificação da Ordem Nacional) e até hoje vota no mesmo partido: PTB. Ele me ensinou isto também: “Não vote em um indivíduo, vote em um partido." E assim eu o fiz: votei no mesmo partido a vida inteira e nunca me arrependi disso, pois foi com esse conselho que aprendi que política é algo coletivo, nunca individual!
Enfim, ele era de direita. Talvez por nostalgia, talvez para agradar meu bisavô que era era militar ou simplesmente porque já era tarde demais para ser um rebelde...Me recordo que quando Tancredo Neves morreu, meu pai foi até meu quarto, me acordou falando baixinho: “Filha, o presidente morreu." Eu chorei. E meu pai também.
Passada a rebeldia da adolescência, ficávamos discutindo política no jantar e quanto mais eu discordava, mais ele gostava... Ao entrar na faculdade me filiei a um partido político (de esquerda, claro) e sempre que eu ia às reuniões, mesmo quando acabavam muito tarde, ele ficava acordado me esperando para conversarmos e eu tinha que contar com detalhes os tópicos dos encontros. Por vezes eu, na mais inocente das teorias de conspiração, imaginava que ele era um desses generais do regime militar, secretamente escondido naquele apartamento em Santos, investigando as ações do partido para delatar meus “companheiros”.
Até que um dia a esquerda ganhou as eleições e ele, pela 1ª vez, disse: “já era a hora de chegar a vez de vocês... Agora é o momento de provar que podem fazer a diferença.” Não sei se fez tanta diferença como ele esperava, mas sinto sinceramente que algo mudou (pra melhor) e só essa sensação de estar inserida nesse momento de transição já valeu muito a pena.
Eu me desinteressei da política, mas aprendi muitíssimo nesse tempo “politizado” da minha história. Estou mais flexível, mais analítica, pois os anos trazem algumas lições também. Não preciso e não concordo mais com o radicalismo, mas exijo seriedade ao se fazer política.
Ainda tenho esperança. Esperança de que teremos pessoas no poder que levem isso a sério de verdade. Pessoas realmente comprometidas com a vida pública e que consigam diminuir consideravelmente a cota de milhões de ignorantes políticos que têm a obrigação de votar em todas as eleições.
Naquele dia de 2003 eu e meu pai assistimos a posse do candidato de Esquerda.E meu pai estava feliz. Foi quando percebi que, durante todos aqueles anos, ele só queria o que todos nós esperamos: atitude.
Parece clichê, mas está nossas mãos fazer um Brasil melhor! VOTEM CERTO!